SATISFACTION pornográfico num Sarau do Liceu.
Sarau no Liceu de Viseu (1967)
No Liceu Nacional de Viseu as tradições académicas vividas nos anos 60 incluíam as festas de despedida dos alunos que terminavam o 3º ciclo - o 7º ano - normalmente nas idades entre os 16 e os 18 anos. No início do ano lectivo era eleita uma Comissão de Festas que organizava e promovia as festas de fim de “curso” que incluíam uma ou outra serenata, um Baile de Finalistas, um Sarau, uma tarde desportiva e a edição do livro de finalistas.
Após aprovação do respectivo calendário as festas tinham início com dois momentos especiais: a deslocação a Lisboa da Comissão de Festas para contratação dos Conjuntos para o Baile, o que era sempre uma grande aventura, e as serenatas que tinham forçosamente de começar no Lar do Sagrado Coração de Jesus, da Rua Alexandre Herculano, 214, normalmente ainda no mês de Dezembro.
Em regra a cronologia dos eventos apontava o baile de finalistas para o 1º fim de semana de Janeiro e, duas semanas depois, realizava-se o Sarau no Ginásio do Liceu. Os restantes eventos ocorriam durante o resto do tempo do 2º período, que ia até à Páscoa.
Os Saraus de Finalistas incluíam Canto Coral, Teatro, jograis e récitas terminando com uma parte musical. Tudo isto feito com a prata da casa, ou seja, estudantes finalistas.
Atendendo a que alguns de seus elementos também eram finalistas, “Os Tubarões” participaram nos Saraus de 1967 e 1968 tendo também actuado nos respectivos Bailes de Finalistas, em 1967 com o “Quinteto Académico” e em 1968 com “Os Sheiks”.
A 21 de Janeiro de 1967 realizou-se o Sarau do 7º ano (66/67). Foi um grande Sarau com um cartaz excelente, uma cuidada apresentação que incluía uma arrojada e muito conseguida adaptação teatral do "Fidalgo Aprendiz" dirigida pelo Dr. Osório Mateus, Professor do 7ºano
( Mais aqui sobre o que foi aquele "O FIDALGO APRENDIZ ).
Nós, "Os Tubarões", além de termos participado na peça de Teatro com uma interpretação instrumental acompanhámos musicalmente alguns dos “Artistas” e encerrámos o Sarau com um espectáculo próprio.
Vivíamos um dos períodos de maior destaque na nossa carreira musical com solicitações de todo o País tocando práticamente todos os fins de semana com cachets elevados mas havia algum tempo que o público de Viseu não nos ouvia.
Desconhecendo-se até hoje se terá sido uma coincidência fortuita, nos dias que antecederam o Sarau gerou-se algum borburinho no meio estudantil por ter sido divulgada a opinião de uma professora do Liceu que considerava pornográfica a letra do grande êxito musical dos Rolling Stones “Satisfaction”, música que fazia parte da nossa playlist com muito sucesso. Começou a gerar-se alguma expectativa sobre se nós iríamos incluir tal êxito na nossa actuação. Nós nada dissemos e deixámos ao José Merino, nosso vocalista, o critério de a interpretar no final da actuação se fosse pedido algum encore. E foi o que aconteceu. Após as 4 músicas previstas muito aplaudidas o “Zé” virou-se para trás e disse: “Vamos ao “Satisfaction”.
De imediato o Victor arrancou da sua Fender Stratocaster vermelha os acordes iniciais do "Satisfaction" e o público mais jovem, ainda surpreso, começava a acompanhar-nos com palmas vibrando e saltando com excitação crescente ao ouvir a voz do Zé Merino a cantar:
"I can't get no satisfaction
I can't get no satisfaction
'Cause I try and I try and I try and I try
I can't get no, I can't get no ..."
(José Merino e Victor Barros com a Fender Stratocaster vermelha)
Mas foi sol de pouca dura. Alguns minutos depois todo o Ginásio ficou às escuras.
O Reitor tinha mandado cortar a luz. Durante alguns minutos o José Merino ainda continuou a cantar o refrão do “Satisfaction” acompanhado pela bateria e um coro de entusiastas no público mas o destino estava traçado. O Reitor veio à frente do Palco dar-nos a ordem para terminarmos a actuação.
E assim terminou o Sarau de 1967 muito comentado nos dias seguintes por toda a cidade e considerado um grande sucesso.
Ainda se especulou que aos elementos do Conjunto alunos do Liceu seria levantado um processo disciplinar, facto que nunca veio a acontecer.
Fontes: “infância em terra pequena” de Luis Canavarro.
Agradecimento ao Fernando Matos.
porep